Um estudo da consultora portuguesa Arboris aponta que 80% dos acionistas inquiridos preferem ter ao leme um CEO que mostre as melhores competências, independentemente de fazer parte do núcleo acionista

A grande maioria das empresas familiares afirma que, na hora de escolher um líder, não são os laços familiares o que mais pesa – pelo contrário, procuram a melhor opção, independentemente da relação com o núcleo acionista.

Esta conclusão é retirada pela consultora Arboris na sequência de um inquérito a grupos empresariais portugueses de raiz familiar. A primeira parte deste inquérito, divulgada esta quarta-feira, debruçou-se sobre “A família acionista e a sua relação com o negócio”. No total foram recolhidas 42 respostas, de um universo de 30 grupos empresariais. 

O estudo aponta que 80% dos acionistas inquiridos preferem ter ao leme um CEO (presidente executivo) que mostre as melhores competências, independentemente de fazer parte do núcleo acionista. No entanto, em circunstâncias em que os candidatos estejam ao mesmo nível em termos de qualidade, os inquiridos apontam que escolheriam o familiar para gerir a empresa. 

Apesar de existirem vários casos em que o CEO é de facto membro da família fundadora, “muitos dos maiores grupos empresariais portugueses de raiz familiar têm CEO ‘profissionais’, isto é, sem qualquer ligação familiar ao núcleo acionista”, lê-se no estudo.

Uma das razões apontadas para que isto aconteça é a não existência, no momento da decisão, de uma alternativa interna. 

Contudo, assinala um dos sócios da Arboris, João Rodrigues Pena, “a probabilidade de existir talento à medida que as gerações vão aparecendo é maior”, pois, à partida, vai crescendo o número de potenciais candidatos. Uma das formas de assegurar boas alternativas dentro deste núcleo é a criação de programas de integração e desenvolvimento da geração seguinte, aponta a consultora.

 

Privilégio do longo prazo

Uma das conclusões mais “positivas”, assinala o também sócio da Arboris José Paulo Rodrigues, é que os grupos familiares têm uma capacidade superior de gerir o negócio a médio e longo prazo.

A pressão sobre resultados de curto prazo “é muito menor” do que nas sociedades mais fragmentadas na estrutura acionista, o que permite manter um foco mais intenso sobre a concretização dos objetivos estabelecidos a longo prazo, por oposição ao caso das empresas de capital aberto. É que a maior parte dos grupos familiares está baseada em modelos de capital fechado.

“Não é possivel dizer que as empresas familiares duram mais tempo. Mas graças ao pensamento a longo prazo, o capital permanece nas mãos de uma mesma família, um dos grandes objetivos de uma empresa desta natureza”, elabora Rodrigues Pena, que considera a capacidade de olhar ao longo prazo uma vantagem competitiva em termos, por exemplo, de política de investimento e da atração de talento. Desta forma, acrescenta-se previsibilidade e a cultura torna-se “toda ela mais coerente”, defende José Paulo Rodrigues. 

 

Coerência e alinhamento com margem de melhoria

À exceção de um caso, todos os grupos empresariais inquiridos consideram que existe um elevado nível de coesão do núcleo acionista – 53,3% afirma que o nível de coesão é forte e 43,3% classifica-o como muito forte.

Mas o núcleo acionista cinge-se aos membros que dispõem de ações, excluindo familiares que ainda não as possuam ou que já as tenham cedido às novas gerações. E o inquérito deteta que o alinhamento de princípios e valores se deteriora quando se considera a família num todo. Ao mesmo tempo, três em cada quatro inquiridos consideram que existe uma intervenção “razoável” a “muito intensa” da parte da família nas opções estratégicas do negócio. 

Em oposição, quase um quarto dos grupos empresariais inquiridos indica que o envolvimento da família nas opções estratégicas do negócio é nulo, e a larga maioria dos grupos familiares inquiridos dizem ter acionistas inativos no seu seio.

São membros da família que possuem ações mas que não integram nenhum órgão do grupo nem exercem poder de decisão formal na condução dos negócios, limitando-se a uma postura passiva. Aqui, o risco é grande, aponta João Rodrigues Pena: podem ser a porta de entrada para alguém de fora, acionistas ativistas, que venham pôr em causa o futuro da empresa. 

Para responder às preocupações de coesão entre os membros da família, a Arboris aconselha como ferramenta a criação de um protocolo de família, um documento onde se formalizam aspetos como os valores, a ética, os direitos e os deveres do agregado, assim como diretrizes para o envolvimento das futura gerações e para a distribuição de riqueza. Um documento que já serviu, por exemplo, para defender ou atacar a posição de determinado acionista em tribunal, garante Rodrigues Pena.

A Arboris lançou-se em novembro de 2020. Os três sócios, José Paulo Rodrigues, João Rodrigues Pena e Pedro Garlito formam a equipa, que se dedica a prestar serviços de consultoria especializados em empresas familiares.

Os grupos empresariais portugueses de raiz familiar representam três quartos do tecido empresarial nacional e produzem dois terços da riqueza anual do país, garantindo cerca de metade do emprego a nível nacional

 


Fonte: EXPRESSO/ SIC NOTÍCIAS