A grande maioria destes grupos empresariais gerem bem a relação das vertentes “acionistas/família”, mas estão a prestar pouca atenção à preparação da “Next Gen”, o que põe em risco o legado e as ideias dos fundadores, conclui estudo da Arboris.

Quando o tema é sucessão, nem tudo vai bem nos maiores grupos empresariais portugueses de raiz familiar. Pelo menos é o que conclui o primeiro de três estudos da Arboris, uma firma de “advisory” a grandes grupos familiares, agora divulgado.

No trabalho “A Família Acionista e a sua Relação com o Negócio” participaram representantes de mais de 30 dos cerca de 40 maiores grupos empresariais portugueses de raiz familiar, com EBITDA superior a 30 milhões de euros e um volume de negócios total superior a 12.000 milhões de euros.

Em conversa com o Jornal Económico, os sócios e fundadores da Arboris João Rodrigues Pena e José Paulo Rodrigues, contaram como foi o trabalho.

“Quando lançámos o estudo dirigimo-lo a 60 personalidades representativas desses 38 a 40 grupos e tivemos um nível de resposta de 75 por cento das personalidades, representando cerca de dois terços dos grupos. É notável e não é obra do acaso, porque andámos a telefonar às secretárias, a dizer ‘não se esqueça de dizer ao doutor XPTO para ele preencher o questionário. Olhe que estamos perto do prazo, etc’”, recorda, com boa disposição, João Rodrigues Pena. Mas as conclusões extraídas dos mais de três meses de trabalho de campo, conduzido no final do ano passado, são poderosas.

A grande maioria destes grupos empresariais tem uma “grande maturidade” a gerir as duas vertentes acionistas/família e estas empresas até estão a trabalhar “muito bem a gestão do negócio”, mas estão a negligenciar – e muito – a preparação da próxima geração de gestores dentro das famílias, o que põe em risco a sucessão e o legado do fundador.

O estudo da Arboris destaca que “a maior parte dos grupos evidencia problemas nas práticas de gestão e de relação no seio da base acionista, aos quais não é dada a devida importância – parece não haver consciência do risco implícito desses problemas sobre o crescimento e valorização do negócio e sobre a própria sustentabilidade do controlo familiar do grupo”.

João Rodrigues Pena concretiza em dois pontos. “O primeiro é que há uma falta de atenção em relação à preparação da próxima geração. A segunda grande conclusão é que apenas um terço dos grupos não têm aquilo que nós chamamos ‘acionistas inativos’. Ou seja, em dois terços grupos existem acionistas inativos, um acionista que não está envolvido, que recebe mas não pede informação, que é passivo. Está a pensar nos dividendos, em viajar, em tudo menos em colaborar ativamente e dar de si para a construção de um legado, da geração a que pertence para a geração seguinte”.

Ou seja, “para que o grupo se perpetue na lógica que o fundador concebeu, de garantir que o seu legado e o controle familiar se preservam de geração em geração”.

Mas isso quer dizer que a gestão está a ser negligenciada? Nada disso. “Deteta-se neste estudo, claramente, um enorme nível de escrutínio dos acionistas relativamente à gestão. Escrutínio sobre o que está a ser feito e, antes disso, uma colaboração muito grande com a gestão executiva na definição das linhas de orientação estratégica”, sublinha o responsável da Arboris.

A ilustrar esta ideia está o facto de estes grupos serem auto-conscientes quanto às “vantagens competitivas estruturais que as empresas familiares os grupos empresariais familiares têm relativamente aos seus concorrentes”.

“Porque não têm que prestar contas de curto prazo, porque não têm que estar sujeitas a determinado tipo de exigências. Quando o controlo é feito por uma família, e às vezes a propriedade é praticamente toda de uma família, eles dizem ‘temos este investimento, não vamos distribuir dividendos durante três anos’. E toda a gente aceita. Claro que há um ou outro acionista que vive de dividendos e haverá algo estabelecido no protocolo de família, que é honrado de forma a que os acionistas que estão mais dependentes desses rendimentos possam estar devidamente protegidos. Mas há visão de longo prazo e uma capacidade de executar essa visão de longo prazo com maior facilidade”, descreve João Rodrigues Pena.

Por outro lado, os acionistas destes grupos dizem-se insensíveis – ou indiferentes – às relações de sangue na liderança dos mesmos. “Quando nós perguntamos nestes grupos ‘você prefere um CEO da família, um CEO profissional ou tanto lhe faz desde que seja o melhor CEO?’ a resposta é, de forma esmagadora, a terceira. Tanto me faz desde que seja o melhor CEO”.

E desta forma responderam 4 em cada cinco representantes dos grandes grupos, concluiu a Arboris.

A grande preocupação “é a próxima geração, a Next Gen”, concluem João Rodrigues Pena e José Paulo Rodrigues. “Se quiser ter uma variável que sintetiza este tema – a variável que é a causa disto tudo – é a proximidade com o negócio e com o grupo. Quando falámos dos acionistas inativos, estes geralmente não têm essa proximidade, não têm por eles mesmos nem é fomentada que tenham. E depois temos o caso da família, onde incluímos a Next Gen. No fundo nós trabalhamos nesse tema, apontando os instrumento que de alguma forma evangelizem ou motivem os acionistas – os inativos ou a família – para que tenham proximidade ao negócio”, diz José Paulo Rodrigues.

Exemplos? “Nós recomendamos que a Next Gen, a próxima geração, tenha, algures entre os 18 anos e os 23 anos, tenha no mínimo seis a oito semanas de um estágio extremamente bem estruturado dentro do grupo. E esse estágio vai permitir aos acionistas atuais perceber o perfil dessa pessoa e orientar a sua carreira”, especifica.

A Arboris pretende realizar dois outros estudos sobre estes grandes grupos familiares portugueses: “A Gestão da Geração Vindoura e a Sucessão para Cargos Executivos de Topo”, previsto para abril, e “O Modelo Formal de Gestão da Base Acionista”, que deverá sair em setembro.

A intenção da consultora é, depois, passar a desenvolver os três inquéritos periodicamente – uma vez por ano ou a cada dois anos, e na mesma altura – de forma a analisar a evolução histórica dos maiores grupos familiares portugueses.

 


Fonte: JORNAL ECONÓMICO